Desenvolvimento e progresso na Amazônia: entre a paixão e o amor

Jackson Fernando Rêgo Matos – IBEF/UFOPA

 

Foto: Ronaldo Ferreira, ponta da Valeria,  praia de Alter do Chão, 2021

 

Para: Franciane Santana Matos


Convivemos há séculos na Amazônia com uma falácia que se instalou e muitos aderiram ou foram capturados por uma ideia totalmente errônea de desenvolvimento e progresso. Para ser construída, o sistema usou a arma mais poderosa e desumana já utilizada: a violência da indiferença que resulta na invisibilidade e inviabilidade de uma população local que, apesar dos podres poderes, resiste e busca ser resiliente a seu modo.

Entre a aldeia local e global, somos um. Quando um caminho une o um ao um, a soma disto é dois. Quando desune, é zero.  Quando se aceita um e se rejeita o outro, não há avanço, apenas acúmulos de um em detrimento do outro.

Ao negar a Amazônia, o Brasil oficioso, sudestino, distópico, criou uma fórmula burlesca e caricata de si mesmo. Um Brasil irreal que não dialoga consigo mesmo, não ouve e nem enxerga a si próprio e assim todas ficam a mercê de uma economia excludente. Um país surdo nunca irá aprender os sinais que o tempo e o mundo nos dão. Ariano Suassuna mostrou que este Brasil de menos de 1% da população, não entende o Brasil real que representa os outros 99%, que trabalham e constroem suas vidas.

Os economistas e políticos que subalternizam o nordeste e o norte, criaram uma matemática para estabilizar, crescer e distribuir os bens da economia. Mas o resultado não fecha, porque é insensível e sempre em uma única direção, indo em direção da lógica dos grandes empresários, de grandes empresas multinacionais que comandam a destruição, carregada de atentados, violações de diretos e injustiças ambientais.  Tendo como escudo a sua própria lógica, não se importam com a dor e o sofrimento que causam às populações desfavorecidas e vulneráveis.

Em Santarém, no Oeste do Pará, exibimos esta semana o filme “Amazônia: A nova minamata?”. Este cinema-documentário, com direção de Jorge Bodanski e Roteiro de Nuno Godolphim, foi assistido por mais de 200 estudantes da UFOPA e do IESPES. O filme mostra a luta do médico Erick Jennings e do povo Munduruku do alto Tapajós, contra a poluição do rio por metil mercúrio que vem causando problemas no cérebro das pessoas e o envenenamento do principal alimento de inúmeros caboclos ribeirinhos, o peixe. Tanto os indígenas, como os discentes que moram nas cidades interioranas que hoje são atingidas pela poluição, ao observarem o alerta do povo do Japão, atingido violentamente pela contaminação causada pela empresa Chisso e as consequências do que causou o mal de minamata, expressaram o medo e a revolta diante da tomada de consciência de uma forma de exploração que atinge não apenas os aldeados, mas todos nós.

Entre a falta de ação do governo do Japão e da empresa Chisso, que mesmo sabendo do mal que a industrialização vinha causando aos japoneses e a falta de ação,  quase 100 anos depois com o que aqui acontece, nos faz refletir sobre o que mais precisa acontecer, para que se combata os ilícitos e transformar esta realidade de destruição, em um processo licito. Cabe a nós nos perguntarmos como sociedade, o que fará acontecer o que Caetano Veloso defende na música Império da Lei. Somente quando o império verdadeiro da lei chegar ao coração do Pará, é que poderemos vislumbrar que 1 (desenvolvimento) + 1(progresso) = 2 (sustentabilidade). Isto é, quando teremos uma matemática consensual, verdadeira, equilibrada, harmoniosa, e saudável, como querem as mães-mulheres que cuidam dos filhos e da casa, dando seu devido valor, que não é o comercial. 

Podemos afirmar que da forma como está, a matemática é a do 1 + 1= 0, pois não há governabilidade e precisamos nos esforçar coletivamente para fazer mudar. E isto, somente uma ciência madura, de ponta e inclusiva, com todos os saberes, uma educação de qualidade em todos os níveis, com arte, filosofia e espiritualidade que respeite todas as crenças, é que saberemos qual o verdadeiro valor do uso de nossa rica biodiversidade por nossos ancestrais. Nossas instituições e Universidades Amazônicas, já fazem isto há muito tempo, mas os que lucram com o jeitinho brasileiro, ainda teimam em resposta de fora para dentro, de cima para baixo, sem respeitar os direitos constitucionais.  

O último documento lançado pelo Banco Mundial, no dia 09 do mês vigente, aponta que o desenvolvimento inclusivo deve prestar muita atenção aos povos tradicionais.  Agindo assim, entenderemos que o que nos importa é o nosso valor cultural identitário, que não tem o preço que querem nos impor, pois apenas  coisificam nossos recursos, como o que faz os autores, atores e diretores de terra e paixão, que se vangloriam de um modelo que vem causando com seus glifosatos e outros defensivos e fertilizantes, o que já nos é muito caro, como o observado com os problemas de saúde das crianças e professores de Belterra.  
 
Essa conta fechará quanto mais rápido tivermos o protagonismo amazônico na linha de frente, construindo juntos o desmatamento zero que o mundo e nós queremos (em abril deste ano caiu 68%), dando a chance de respirarmos e caminharmos em direção a travessia que precisamos fazer, não ficando à margem de nós mesmos.

Entre a pá-i-chão e o amor à terra, devemos optar por caminhamos seguros em nosso solo que representa o afeto e a segurança de pertencermos a um ambiente sagrado, sem nos deixar ser enganados pelas modernas fábricas de ilusão, só reza pode nos livrar do mal e caminhando de mãos dadas, junto ao amor que nos uniu eternamente, talvez ainda façamos muita gente feliz, como a Rita e o Roberto, para o bem de todos. Aí sim chegaremos a 100 %. 
 
                
         

Santarém, 15 de maio de 2023 – quando completamos 2 anos de casados.

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